A professora
Carol convidou seus alunos para fazer uma visita na casa de repouso dos idosos.
Arturzinho reclama:
__ Por que em uma casa de
repouso, professora? Vamos ao orquidário, zoológico, cinema! É mais divertido.
A professora Carol responde,
sorrindo:
__ Nem tudo na vida é diversão,
vamos prestar a nossa solidariedade aos nossos amáveis idosos e além do mais,
turma, essa visita não é obrigatória, vai quem quiser. Vamos passar uma tarde
na companhia de pessoas experientes, conhecerem suas histórias de vida, tenho
certeza que vai ser muito gratificante para ambas as partes. Sugiro que cada um
leve um prato de doces, ou salgados para o lanche.
Na tarde seguinte à classe estava
lotada, com os alunos animados e ansiosos para começarem logo a visita,
surpreendendo a professora Carol. Até mesmo aqueles que não eram adeptos a
excursões compareceram e assim logo após a leitura da chamada saímos. O recanto
dos idosos era ali perto e fomos caminhando seguindo a nossa professora. Quando
lá chegamos fomos recebidos pela diretora da instituição, que já nos esperava
nos encaminhando para um amplo salão, onde alguns idosos nos aguardavam para o
lanche da tarde. No começo, ficamos tímidos todos em volta da professora. Os
vovôs e as vovós estavam do outro lado da sala, com olhinhos curiosos sorriam
para nós, a diretora da casa de repouso se aproximou os apresentando, dizendo
seus nomes e idades, falou de suas doenças, uns sofriam de diabetes, outros,
problemas nos rins, cardíacos, etc. Ou seja, além da idade avançada ainda tinham
que lutar com as doenças, e continuou a diretora, mais os que estão aqui são os
que podem sair da cama, me acompanhem, venham conhecer os que estão na
enfermaria, acamados.
A professora Carol percebe os
olhinhos assustados dos alunos, diante dos rostos abatidos quase cadavéricos
dos velhinhos da enfermaria, dava pra sentir os coraçõezinhos das crianças
apertados, e mais uma vez a diretora explicou: Esses pacientes têm doenças
crônicas, já não conseguem sair do leito, quase não ouvem e dormem a maior parte
do tempo. A professora se aproxima de um dos leitos, acompanhada pelo grupo de
alunos apreensivos, ela chega bem perto de um dos idosos, acariciando seus
cabelos e mãos, esse, retribui com um sorriso o carinho, com voz macia, a
professora conversa com o velhinho acamado sugerindo a turma que fizesse o
mesmo nos outros leitos, pois tudo que aqueles idosos necessitavam agora era de
carinho e de suas atenções.
E assim, as crianças fizeram, se
dividindo em grupos em volta dos leitos. Não demora muito, onde antes se via
dor e tristeza, de repente a luz se fez, dava para se ouvir até os sorrisos dos
vovôs se divertindo com as perguntas das crianças. Para aqueles que podiam se
alimentarem, a professora pediu que as crianças os ajudassem a tomar o chá com
biscoito, esse foi um momento muito mágico pra nós. A felicidade de estar sendo
útil, em troca era retribuída com singelos sorrisos e assim nos despedimos dos
vovôs da enfermaria, com um longo abraço. Lembrarei para sempre daqueles
olhinhos carregados de ternura. Logo, fomos chamados para o salão principal
onde o lanche estava sendo servido. Encontramos com os velhinhos que tínhamos
nos recebidos na entrada, esses estavam sentados em volta da mesa nos
esperando. Agora estávamos mais a vontade e sabíamos o que fazer. Se juntamos
aos vovôs e vovós, cantamos e dançamos, rimos de suas piadas e ouvimos suas
histórias de vidas tristes e alegres. Do meu grupo, a vovó mais animada era a
dona Palmira, cantava e dançava todo tipo de música, estava com 87 anos e dizia
se sentir uma garotinha. Em sua juventude foi vedete, não construiu família,
passou seu tempo brilhando nos palcos da vida. Ao contrário de dona Palmira era
a dona Marinalva, que passou o tempo todo reclamando que tinham lhe roubado os
brincos e o relógio e dizia mais, com uma profunda mágoa:
__ E não satisfeitos ainda roubam
a minha pensão. E tem dia, que nem comida me dão.
Aninha ficou indignada.
__ Mas isso é um caso de polícia!
A diretora da instituição logo se
aproxima, explicando que não levasse ao pé da letra o que a vovozinha dizia:
__ A nossa Marinalva está muito
velhinha, não diz coisa com coisa, aliás, todos aqui então em idade avançada,
ela deve estar sentido falta de suas jóias, os filhos dela levou para casa
deles, nós aqui não permitimos nada de valor, com os pacientes.
Outra que também se queixava era
dona Ivone. Ela estava com 75 anos, era professora, disse ter duas filhas e 6
netinhos. Gostava de dançar e ir a praia, mas que agora estava ali no asilo.
Disse a última palavra com certa tristeza, o que não passou despercebido por
Gabriel.
__ O que foi vó Ivone? A senhora
não gosta daqui?
__ Fazer o que, meu filho!
Ficaram com a minha casa e me jogaram nesse lugar. Minhas filhas dizem não ter
tempo de cuidar de uma velha caduca.
Lá no cantinho do salão tem outra
vovozinha muito triste, Marília se aproxima.
__ E a senhora vovó, por que esta
tristeza toda?
__ Minha família me abandonou,
porque eu não sirvo mais pra nada. Respondeu a avozinha, chorando.
Vó Palmira se aproximou, tentando
acalmar a pobre senhora.
__ Coitada! Desde que chegou aqui
está sempre deprimida. Chora o tempo todo, a Bernadete é minha vizinha de
quarto. Até a pouco tempo tinha casa, marido, filhos e netos. Há menos de três
anos recebeu um diagnóstico constatando que ela tinha mal de Alzheimer. Seu marido, apesar de ser mais
velho que ela, estava bem, porém ele não teve paciência para cuidar da esposa
doente. Sua cabeça já não era mais a mesma, se queixava de um grande vazio na
mente, tinha dia que não sabia nem qual era o nome dela, não sabia mais
cozinhar e nem servia pra cuidar da casa. Os filhos também não tinham tempo
para cuidar da mãe, pro marido ela deixou de ser útil, dizia que ela tinha se
tornando um estorvo para ele e então pai e filhos decidiram internar–la nesse
asilo, por ela não ter mais serventia na vida deles.
E assim passamos a tarde ouvindo
os velhinhos contando suas histórias, como se esta tivesse se passando há muito
tempo atrás, era como se eles fossem meros espectadores de uma vida longicua.
Aquele, com certeza foi um dia
marcante para a turma da sétima série. Eu olhava os rostinhos sorridentes
daqueles velhinhos abandonados, sentindo um nó na garganta. Fizemos de tudo
para que esses tivessem uma tarde feliz. Dançamos, cantamos e nos emocionamos
com as histórias dos vovôs, mas saí de lá com uma certeza. Nenhum familiar meu,
se depender de mim não irá para o asilo, era triste e até mesmo revoltante
presenciar a que ponto chega a ingratidão de um ser humano.
Quando terminou o horário de
visitas nos despedimos dos avozinhos sentindo um grande pesar por aqueles
desvalidos de afetos. Era constrangedor e decepcionante presenciar um ser
humano depois de viver tanto, ser abandonado pra morrer sozinho.
Ao retornar a escola era visível
a cara de tristeza e indignação em nossos semblantes, fomos todos direto para
classe, ficamos sentados por um longo tempo em silêncio, cada um envolvido com
o seus pensamentos, chocados com a realidade deprimente dos idosos que lá
conhecemos. Era um verdadeiro descaso com o ser humano, ninguém merece ter um
final de vida, longe de seus entes queridos.
__ O que é isso, crianças, que
tristeza é essa? Foi tão ruim assim o passeio? Pergunta a professora, tentando
colocar animação na voz.
Foi Arturzinho quem quebrou o
silêncio.
__ Professora, pensei que só as
crianças fossem abandonadas, eu acho que não deveria existir orfanatos e nem
asilos!
__ Não é bem assim, Arturzinho!
Esse tipo de instituição tem que existir. O orfanato, para abrigar as crianças
abandonadas e o asilo, para cuidar dos idosos que não tem familiares para
ampará-los em sua velhice e se não tem paciência e nem tempo para cuidar
desses, preferem passar o problema para o governo, ou internam seus idosos em
clínicas particulares.
__ Me desculpe professora!
Retrucou Marília. Mas o que eu vi ali é um verdadeiro descaso dos familiares,
todos aqueles velhinhos jogados a própria sorte. Era nítido, a magoa no olhar
deles, pra mim, asilo ou clínica de repouso é um lugar que os familiares
abandonam os velhinhos pra morrerem.
__ Como eu já disse, esse tipo de
instituição é um mal necessário, alguém tem que cuidar dos idosos e eles não
estão abandonados a própria sorte, o governo se responsabiliza por eles.
__ Não professora! Não estou me
referindo a instituição em si, é justo que haja esta proteção para os idosos
que não tem ninguém no mundo para ampará-los em seu final de vida, mas esse não
é o caso de todos aqueles idosos que estão internados naquela casa de repouso
que acabamos de visitar. Tá, digamos que um por cento dos idosos que estão
internados na clínica de repouso, hoje não tenha mais família para cuidar
deles, mas e o resto? O que estão fazendo longe da família? Para mim, esse tipo
de lugar está se tornando um comércio, por ser mais cômodo para a família, é
uma forma de descartar dos seus idosos, sem culpa. Tem algumas casas de repouso
que são até bem luxuosas. Outro dia fui visitar uma avó de uma amiga minha em
uma dessas clínicas de repouso, agora é assim que se chama o asilo, a
pobrezinha da vó dessa minha amiga estava triste, isolada em um canto, dizia
que não queria ficar ali, chegou a chorar implorando pra que a filha a levasse
pra casa, a coitada nem sequer foi ouvida, a mãe da minha amiga, se ficou dez
minutos com a mãe foi muito. Logo nós viemos embora, porque ela disse que tinha
muito que fazer e só tinha ido visitar a mãe naquele dia, porque a Ritinha, a
minha amiga estava com saudades da avó. Saindo do asilo, sabe o que a mãe da
Ritinha foi fazer? Direto pro salão de beleza, não demorou muito a avó da Ritinha
morreu, se sentindo um cão sarnento que foi abandonado. Eu acho que o governo
deveria ser mais rigoroso e não deixar abrir esse tipo de comércio e se
permitisse com uma cláusula, seria apenas para aqueles que não tem família para
ampará-los, do contrário, filhos e parentes deveriam se responsabilizarem por
seus idosos. Deveria ser lei, na falta do desamor por esses.
__ Concordo com você Marília, mas
os velhinhos estão assegurados através do instituto do idoso e os velhinhos que
estão no asilo não estão jogados a própria sorte, tem uma equipe de
profissionais bastantes competentes, que são pagos para cuidarem dos nossos
idosos.
__ Mas nada se compara viver em
volta do carinho da família, por mais luxuosa que a clínica seja. Quanto ao
estatuto do idoso já ouvi falar dessa lei, mas ela só cabe os maus tratos com
idosos, a lei mais uma vez foi amena. Maus tratos aos idosos, deveriam ser
considerados crimes hediondos. Imagine um pai sendo espancado por seu filho, ou
neto espancarem avós, como será que essas vítimas se sentem em seu íntimo, é
uma dor moral que deve ferir a alma, no entanto professora estou falando de
responsabilidade, afeto, gratidão. A lei deveria ser mais rigorosa para punir
essas pessoas que jogam seus entes queridos no asilo, por simples fatos desses
estarem velhos e doentes.
Todos estavam muito emocionados,
alguns choravam penalizados com a situação dos idosos, que um dia foram tão
útil para sociedade.
Bentinho disse, soluçando:
__ Professora, eu não quero ficar
velho, tenho medo que minha família me abandone. É muito ruim ser rejeitado,
será que os familiares que internam seus pais, seus avós em um asilo, conseguem
dormir em paz? Porque eu me sentiria envergonhado, a ingratidão é um dos
sentimentos que mais aniquila um ser humano.
A professora Carol também estava
bastante sensibilizada, nunca tinha visto os seus alunos tão emocionados.
Olhando a carinha deles, com pesar depois de dar um longo suspiro, finaliza:
__ É turminha! Quem sabe um dia a
nossa lei não enquadre esses filhos ingratos, que hoje estão livres da lei do
homem, mas não livres da lei de Deus!
Gabriel, lá no fundo da classe,
pergunta:
__ Professora! Não é a senhora
mesmo que diz, que Deus não castiga ninguém?
__ Sim, Gabriel! Deus não castiga
ninguém, mas permite que os seus filhos sofram quando esses insistem em
caminhos errados, para que aprendam a ser bons com os seus semelhantes e não
faça nada ao próximo, que não deseja a si próprio, e não pensem que Deus está
sendo cruel, ou omisso, nosso pai maior não gosta de ver seus filhos sofrendo e
também não o abandonam a própria sorte. Ao nascermos, recebemos todo amparato
que necessitamos para a nossa orientação moral e espiritual dentro de uma
família. Aquele pai, aquela mãe, mesmo não sendo biológicos são os anjos
protetores que temos aqui na terra, que tem a incumbência de orientar os seus
tutelados em sua evolução espiritual, esses anjos de tudo fazem por suas
proles, muitas vezes até se anulam como pessoa, só pela satisfação que esses
filhos cresçam e sejam bem sucedidos em sua caminhada em todos os sentidos de
sua vida. E mesmo assim, quando esses anjos estão em meio a ingratidão eles
rezam para que seus filhos não ser percam na escuridão.
UM FELIZ DIA DOS PAIS
Dilma Lourenço Moreira
Os idosos merecem apoio e carinho dos filhos e principalmente consideração por tudo que fizera e como pais, bela postagem.
ResponderExcluirBeijo.